terça-feira, 18 de novembro de 2008

Chamada de trabalho: CIDADE, CIDADANIA E GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA

Periódico de publicação semestral da PUC/SP e IPPUR/UFRJ, tem ocompromisso de divulgar a produção científica das áreas de sociologia urbana, planejamento urbano e regional, políticas públicas e gestão urbana, enfocando os temas ligados à questão urbana/metropolitana.
Tendo em vista a organização do nº 21 da revista sobre o tema CIDADE, CIDADANIA E GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA convidamos os pesquisadores das diversas áreas de conhecimento que abordam a questão urbana e regional a enviarem textos que abordem o tema, focalizando as seguintes questões:
1) Analisar a relação entre os processos de segregação residencial e a emergência de uma cultura cívica favorável à afirmação da cidadania;
2) Discutir em que medida o ambiente social e cultural na metrópole, bem como a natureza das relações sociais e da sociabilidade nela vigentes criam condições institucionais, políticas e intersubjetivas que favorecem o desenvolvimento de comportamentos baseados na consciência de direitos de cidadania;
3) Refletir sobre a forma como a vida urbana afeta e é afetada pelo exercício da cidadania e pelos movimentos sociais em prol dos direitos a ela associados;
4) Avaliar os efeitos da urbanização e sub-urbanização; o efeito-metrópole; sobre o exercício dos direitos de cidadania.

Data-limite para postagem dos trabalhos: 5 de dezembro de 2008

Os trabalhos devem ser encaminhados em CD, para a Caixa Postal 60022; CEP 05033-970 ; São Paulo; SP; Brasil.
Os textos devem ser em Word; tabelas e gráficos em Excel; imagens em formato TIF, com resolução mínima de 300 dpi e largura de 13 cm , sendo que devem ser enviadas, também, duas vias impressas, sem identificação do autor, digitadas em espaço 1,5, fonte arial tamanho 11, margem 2,5,tendo no máximo 25 (vinte e cinco) páginas, incluindo tabelas,gráficos, figuras, referências bibliográficas, acompanhados de umresumo em português ou na língua em que o artigo foi escrito e outro em inglês, contendo no máximo 120 (cento e vinte) palavras, com indicação de 5 (cinco) palavras-chave.
Anexar uma folha de rosto contendo as seguintes informações, _porextenso_: nome do autor, formação básica, instituição de formação,titulação acadêmica, atividade que exerce, instituição em que trabalha, unidade e departamento, cidade, estado, país, e-mail,telefone e endereço para correspondência.
As referências bibliográficas deverão ser colocadas no final doartigo, seguindo rigorosamente as seguintes instruções:
LIVROSAUTOR ou ORGANIZADOR (org.) (ano de publicação). /Título do livro./Cidade de edição, Editora.EXEMPLO:CASTELLS, M. (1983). /A questão urbana/. Rio de Janeiro, Paz e Terra. CAPITULOS DE LIVROS AUTOR DO CAPÍTULO (ano de publicação). ;Título do capítulo;. In: AUTOR DO LIVRO ou ORGANIZADOR (org.). /Título dolivro. /Cidade de edição, Editora.
EXEMPLO:BRANDÃO, M. D. de A. (1981). ;O último dia da criação: mercado,propriedade e uso do solo em Salvador;. In: VALLADARES, L. do P.(org.). /Habitação em questão/. Rio de Janeiro, Zahar. ARTIGOS DE PERIODICOS AUTOR DO ARTIGO (ano de publicação). Título do artigo. /Título doperiódico/. Cidade, volume do periódico, número do periódico, páginasinicial e final do artigo.
EXEMPLO:TOURAINE, A. (2006). Na fronteira dos movimentos sociais/. Sociedadee Estado. Dossiê Movimentos sociais/. Brasília, v. 21, n.1, pp. 17-28. TRABALHOS APRESENTADOS EM EVENTOS CIENTIFICOS AUTOR DO TRABALHO (ano de publicação). Título do trabalho. In: NOME DO CONGRESSO, número, ano, local de realização. Título da publicação.Cidade, Editora, páginas inicial e final.
EXEMPLO:SALGADO, M. A. (1996). Políticas sociais na perspectiva da sociedadecivil: mecanismos de controle social, monitoramento e execução,parceiras e financiamento. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL ENVELHECIMENTOPOPULACIONAL: UMA AGENDA PARA O FINAL DO SÉCULO. /Anais/. Brasília,MPAS/SAS, pp. 193-207. TESES, DISSERTA E MONOGRAFIAS AUTOR (ano de publicação)./ Título/. Tese de doutorado ou Dissertaçãode mestrado. Cidade, Instituição.
EXEMPLO:FUJIMOTO, N. (1994). /A produção monopolista do espaço urbano e adesconcentração do terciário de gestão na cidade de São Paulo. O casoda avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini/. Dissertação de mestrado.São Paulo, FFLCH. TEXTOS RETIRADOS DE INTERNET AUTOR (ano de publicação). Título do texto. Disponível em. Data de acesso.
EXEMPLO:FERREIRA, J. S. W. (2005). A cidade para poucos: breve história da propriedade urbana no Brasil. Disponível em:http://www.usp.br/fau/depprojeto/labhab/index.html. Acesso em 8 set.2005.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

R @ U - Revista dos Alunos de Pós-Graduação em Antropologia Social - UFSCar

R @ U - Revista dos Alunos de Pós-Graduação em Antropologia Social - UFSCar

Chamada para colaborações!

A revista R@U receberá colaborações em fluxo contínuo. A chamada para a sua primeira edição tem como data-limite o dia 15/12/2008, a qual será publicada no primeiro semestre de 2009. Para conferir as normas e diretrizes para autores, clique aqui
Publicação organizada pelos alunos do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
r@u destina-se à apresentação e discussão de pesquisas e trabalhos que contribuam para a compreensão da realidade sociocultural e para o desenvolvimento da Antropologia, procurando colocar o leitor em contato com os mais importantes temas e questões contemporâneos da disciplina.

A revista publica trabalhos inéditos, elaborados no contexto das diversas áreas do conhecimento relacionadas com a Antropologia Social em seu sentido mais amplo. Especial atenção é concedida a trabalhos que contribuam para a investigação e esclarecimento de aspectos fundamentais da sociedade e cultura brasileiras, buscando, ao mesmo tempo, captar sua singularidade e inseri-los no contexto global mais amplo de que fazem parte.


ISSN: 0000 - 0000*nosso número de registro definitivo na base ISSN - IBICT será concedido após a segunda edição da revista
Para inscrição da revista na base Lattes, utilizar os seguintes dados:
R@U - Revista de Antropologia PPGAS - UFSCar

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

São Paulo na mídia eletrônica, por Brasilmar Ferreira Nunes

A televisão no Brasil é um veículo de comunicação com um poder fantástico. Particularmente as novelas, cuja penetração em todas as classes sociais faz delas um fenômeno particular de mídia no mundo. Várias dimensões da nossa vida cotidiana, os valores e costumes em nossa sociedade, desde moda vestimentária, termos e expressões lingüísticos, valores éticos e morais, comportamentos, dentre outros, são por elas influenciados. O Brasil urbano tem destaque especial nas tramas, com exceção de uma ou outra produção que trata do mundo rural, sempre como um apêndice de histórias onde as interações em cidades é o principal eixo. Delas, portanto, é uma concepção de mundo urbano que nos é passada cotidianamente, onde cenários os mais diversos se entrecruzam através das histórias e de seus personagens. Em todas é a vida do brasileiro na cidade o pano de fundo, o que termina por difundir uma peculiar representação do urbano brasileiro.
Das novelas televisivas, a chamada “novela das oito” da TV Globo é a que alcança os maiores índices de audiência. Escritas por quatro ou cinco autores principais que se revezam, são eles o triunvirato que vem formando a imagem de Brasil nessas últimas décadas, com enorme o poder de influência e de impacto sobre as mentalidades, uma das características da televisão brasileira, talvez única no mundo nesse particular. O Brasil, nossa sociedade é, ou será, aquilo que se reflete na novela “das oito”.
Nesses últimos meses fomos colocados à frente de uma destas telenovelas “das oito” da Globo – A favorita – escrita por um autor que foge aos quatro ou cinco tradicionais noveleiros responsáveis pelo horário neste canal. Dentre as inovações conceituais que insere na estória dos personagens quero destacar uma originalidade frente à anteriores, pelo menos desses últimos anos. A grande maioria das histórias novelescas se passam no Rio de Janeiro; nesta é a cidade de São Paulo que se mostra como pano de fundo para a circulação de tipos humanos e de vidas que se entrecruzam, em geral dramaticamente. Portanto, um cenário sem praia, sem sol, sem verão.
O princípio máximo nos diz que novela televisiva é uma fantasia. Todos temos isso em mente e não se foge a este princípio às custas de não alcançar índices aceitáveis de audiência e, portanto não ir ao ar. É um produto que se vende, tem, portanto que seduzir e isso resume sua dinâmica mercadológica. Esse princípio envolve também a apresentação cenográfica. Uma favela ou uma área rica devem conter signos palatáveis, pois o objetivo é aquilo que se passa entre os personagens; é isso que deve mobilizar a atenção imediata do telespectador.
A São Paulo da trama é uma cidade misteriosa. Entre uma cena e outra ela aparece em imagens fantásticas, uma espécie de Metropolis do século XXI com arranha-céus e avenidas, às vezes distantes, e raras vezes com pessoas comuns caminhando pelas ruas. A São Paulo que ali aparece é a cidade onde se circula de automóvel, e nesse particular, uma cópia de Brasília, esta sim a verdadeira cidade das quatro rodas. O cenário é o pano de fundo, mas não deixa passar a dificuldade que é circular e interagir na cidade no dia-a-dia. Em outras palavras, o automóvel e os arranha-céus não estão inseridos na trama, que constrói as personagens de diferentes mundos sociais que, num ritmo peculiar, se entrecruzam num jogo que ultrapassa as diferenças sociais.
O foco sobre determinadas figuras reduz a vida na metrópole a um ritual de pequena cidade. As pessoas se conhecem, ou são construídas para se conhecer, se freqüentam independente da origem social, transitam por mundos restritos que os aceita sem a preocupação com a origem social. Assim, a filha de um magnata cuja fortuna a coloca entre as famílias da alta burguesia paulistana pode muito bem se apaixonar por um funcionário de baixo escalão de uma das empresas do avô, ou pelo filho de uma cafetina que mantém uma casa de prostituição em um bairro de classe média alta da cidade. Em nenhum momento ela se relaciona com seus iguais e o seu círculo de relações não causa estranheza nos seus pares. Não há distâncias sociais visíveis.
As facilidades de se mover entre mundos sociais opostos passa uma sutil mensagem sobre a possibilidade de inexistência de conflitos inter-classes. Os conflitos são individuais e jamais relacionados à posição social de cada um. Não há barreiras sociais entre os diferentes mundos e a facilidade de trânsito nos automóveis se completa com a facilidade no trânsito entre os grupos de origens distintas. O que move as pessoas, o que as fazem amar, odiar, prevaricar, é a sede de dinheiro, e do poder que ele pode oferecer. A dinâmica do mundo é ditada pela possibilidade de se ter o vil metal em mãos, em um mundo onde a sobrevivência é assegurada e tranqüila.
Temos, portanto aí uma visão de mundo e da cidade de São Paulo onde os bons e os justos estão por toda parte, e seriam felizes se não fosse a presença de alguns tipos mesquinhos capazes de qualquer gesto para obter dinheiro e poder. Seja um político, seja um operário, seja uma cafetina, seja mesmo um gigolô são personagens que jogam o papel de vilões num mundo dos justos. O fim será sempre o mesmo, os bons com os bons e os maus ou mortos, ou presos, ou fogem para um outro país, mas jamais ficarão no Brasil, ou em São Paulo. De fato, a São Paulo da trama é a mesma Rio de Janeiro das demais novelas das oito, onde o indivíduo é o rei.
Porém, outra São Paulo é mostrada no cinema nesses últimos dias e que é o oposto daquela cidade da “novela das oito”. É a cidade da periferia imensa, cujos limites são fluídos, onde não existem arranha-céus, onde as residências são simples, com esse ar de “em fase de terminar” que caracteriza os subúrbios de nossas metrópoles. Trata-se do “Linha de Passe” filme de Walter Salles em cartaz nos cinemas no Brasil.
Estamos aqui na margem da sociedade: há uma dificuldade enorme na vida cotidiana, com dramas que se originam da condição social mais do que propriamente dos indivíduos isolados. O universo da periferia é, portanto cru, seco, anônimo, onde até mesmo os afetos são brutos nos seus gestos e nas suas expressões. Os mundos sociais são inteiros, isolados, sem cruzamento com outros mundos: não se misturam.
A São Paulo mostrada passa longe da Avenida Paulista ou dos bairros dos Jardins. São mundos opostos que não se enxergam. Nem mesmo a oposição entre eles aparece, pois é como se ignorassem um ao outro. A condição de doméstica da personagem principal trabalhando para uma família de classe média em nenhum momento deixa transparecer uma cumplicidade entre os mundos ali presentes. São figuras estranhas que se relacionam via salário, de forma impessoal, onde os afetos ou não existem ou são reprimidos para não romper a relação salarial, esta anônima. O próprio ambiente da área onde se situa o apartamento da patroa não é mostrado. Tudo se passa como se fosse externo ao olhar da empregada, para quem os sonhos e a sobrevivência cotidiana é um abismo onde a possibilidade de cair é um princípio de realidade. Nada está garantido, tudo pode ruir a qualquer momento; disputa-se cada dia a possibilidade do dia seguinte, seja como pastor de uma igreja evangélica, uma busca obstinada por um espaço no mundo do futebol, uma busca obsessiva por um pai ausente.
A unidade familiar aqui é o esteio que sustenta na figura da mãe como chefe. Todos seguem rituais ditados por ela. Ela comanda a vida de cada um com autoridade que advém da própria condição de sobrevivente. Interessante que a mãe aqui é diferente da mãe da “Favorita”. Ali ela é uma figura a mais na cena familiar, com poderes limitados frente à figura do filho ou do chefe da família, seja ele o grande industrial, o antigo operário, ou a que disputa um amor de filha com a outra. Na São Paulo de Salles, a figura da mãe é a chefe incontestável. Ela coordena a vida dos filhos através de fios invisíveis, de uma autoridade natural, de um compartilhamento comum do cotidiano que gera uma cumplicidade absoluta.
Além de uma construção dramática oposta entre as duas obras, o interessante nas tramas é a cidade como ambiente determinante. Na novela, a história poderia se passar em qualquer lugar, pois o mundo quem o faz são os indivíduos dentro dele. Talvez porque o hábito de se ver famílias ricas onde tudo no cotidiano se resume a coisas banais tão recorrentes em novelas nos tenha habituado ao mundo dos poderosos. Ele nos é familiar, quase um conhecido íntimo que freqüentamos assiduamente. A mansão do industrial, as moradias dos operários, os apartamentos onde circulam personagens tudo é asséptico, com as coisas no lugar, sem maiores surpresas. As personagens são identificadas por si só, pelo que elas parecem ser. Na novela não há uma identidade explícita do lugar; o lugar ali é qualquer lugar do mundo.
No cinema, a periferia de São Paulo é personagem, tanto quanto as figuras humanas. As ruas estreitas, tortuosas, mal iluminadas, a diversidade de estilos das casas, o ar de abandono que caracteriza tanto o interior como o exterior das casas, nada se enquadra numa lógica racional de desenho urbano. A cidade aqui é um depósito de gente que dificilmente se apega ao lugar. No cinema, o lugar é produtor de identidades: as pessoas são o que são também porque moram em um lugar determinado. Lutam para se tornarem visíveis numa cidade que os colocam na invisibilidade. Se movem, se vestem falam e olham com um estilo peculiar.
Por mais que a imagem televisiva nos tente mostrar que estamos no melhor dos mundos apesar de alguns tipos isolados que o perturba, a contraposição com a São Paulo da periferia nos faz perceber que o Brasil continua sendo uma sociedade fragmentada, com mundos isolados que não interagem entre si, A cena onde o motoqueiro grita para um classe média, que poderia ser um personagem da novela, para que este o olhe na cara é a síntese da trama e do drama brasileiro.

sábado, 27 de setembro de 2008

JUVENTUDE E POLÍTICAS PÚBLICAS: cidade, espaços e equipamentos públicos de uso coletivo


Universidade de Brasília – UnB
Departamento de Sociologia
Programa de Pós-Graduação

Edital nº 07/2007
Seleção pública de projetos de pesquisa – demanda induzida
Área temática: políticas públicas em ciências sociais e humanas
Classificação da área do conhecimento: 0613- Sociologia

Equipe:
Prof. Dr. Brasilmar Ferreira Nunes – UnB (coordenador)
Profª Drª Magda de Lima Lúcio – UNICEUB (pesquisadora)
Profª. Drª. Sayonara Leal (pesquisadora)

1. Introdução

Nas últimas décadas, as análises sobre a realidade urbana na América Latina, particularmente no Brasil, incorporam novos elementos críticos à tradicional imagem de “territórios de déficits” característicos de nossas cidades. O processo histórico recente vem intensificando a urbanização continental, trazendo à tona padrões peculiares de uso e ocupação do território. A democratização política do continente, a globalização da economia, a ampliação do consumo de massa e o progresso técnico, dentre outros fatores, colocam novas possibilidades de análise do fenômeno urbano no continente. No bojo das causas e efeitos do fato urbano chama atenção as condições sociais e humanas de existência dos jovens que são, no caso brasileiro, segmento mais numeroso na escala de crescimento do contigente demográfico das cidades. Para essa parcela da população, faltam emprego, ocupações sociais. Em meio à juventude cresce a violência, associada ao consumo de drogas e a marginalização que decorrem, em grande parte, da ausência ou insuficiencia de políticas públicas voltadas para o enfrentamento da questão social dos jovens nas zonas urbanas e rurais.
O processo de urbanização das metrópoles brasileiras vem se caracterizando por: a) amplo processo de periferização, resultando em espaços com elevado padrão de infra-estrutura ao lado de áreas carentes e precarizadas; b) padrões de renda familiar com elevados níveis de desigualdade; c) distribuição também desigual do emprego no território intra-urbano, gerando áreas com alto potencial de empregabilidade ao lado de outras com baixíssimos potenciais; d) índices de violência guardando estreita correlação com índices econômicos e culturais; e) crescimento populacional alimentado, sobretudo por migrações internas. Essa urbanização, com tais características gerais, obedece a múltiplas lógicas no uso e na ocupação do espaço de nossas metrópoles. Em um mesmo espaço urbano convivem diferentes tempos sociais e formas de controle distintas. Ou seja, a urbanização das metrópoles brasileiras é também marcada pela heterogeneidade. É sobre este último aspecto que iremos concentrar nossa análise sobre o Distrito Federal. As análises sobre a realidade social em Brasília se caracterizam pela predominância de temas ligados à dinâmica do setor público, se não bastasse o fato de que a cidade sendo capital política tem no Estado a sua principal referência. Há que se destacar, por um lado, que o Estado induz o aparecimento de atividades complementares tanto em alguns setores industriais (gráfica, móveis, materiais de escritório, etc.) como na prestação de serviços (comércio, pessoais, de consultorias, etc.). Por outro lado, parte significativa dos migrantes que chegam à cidade não está qualificada para disputar postos disponíveis no aparelho de Estado; mesmo a iniciativa privada não consegue absorvê-los de forma a evitar o aparecimento de levas de desempregados. Dados recentes da CODEPLAN, órgão do Governo do Distrito Federal (GDF), mostram que o crescimento populacional do Distrito Federal vem se fazendo através da entrada de pessoas com baixa qualificação profissional e, portanto, com baixo nível de renda
(CODEPLAN/PDAD/2004).
O desenho da cidade é feito de tal forma que as evidências do desemprego no seu cotidiano estão diluídas em satélites dormitórios que permanecem desconectadas da área central onde se concentram os postos de trabalho do setor público federal e distrital. Ao mesmo tempo, circulando pelo Plano Piloto e mesmo pelas diferentes regiões administrativas do Distrito Federal, é relativamente pequeno, por exemplo, o número de ambulantes nos espaços públicos se considerarmos o fenômeno em outras cidades do país com níveis populacionais próximos ao da capital federal. Recife, Salvador, Belém, Fortaleza, dentre outras são áreas com níveis relativos de desemprego até menores do que o Distrito Federal e evidenciam um comércio de rua dinâmico, ao contrário de Brasília. Assim, a lógica urbana presente no Distrito Federal, guarda estreita proximidade com as lógicas urbanas presentes nas demais metrópoles brasileiras embora tenha surgido a partir de rigorosos critérios de planejamento urbano. Vejamos mais em detalhes esse fenômeno.
Na origem, quando de sua concepção e construção, a denominação “Brasília” identificava a nova capital do país e esta se confundia com o Distrito Federal. Durante sua construção investiu-se no chamado “Plano Piloto”, justamente a área da nova cidade onde se localizariam as instituições públicas dos três Poderes da República, além das moradias para a burocracia que para lá seria transferida. No plano urbanístico de Lúcio Costa havia referências às cidades “satélites”, mas nenhum projeto mais acurado foi feito para elas, fora a identificação de algumas de suas
possíveis localizações dentro do perímetro do futuro Distrito Federal. Passados 47 anos, o resultado é que ao lado de um “Plano Piloto” emblemático pelo seu significado simbólico, vem ocorrendo a expansão urbana do Distrito Federal de maneira semicontrolada, nele se repetindo as tradicionais formas de expansão de áreas urbanas do país. Os vultosos investimentos que foram necessários disponibilizar para a construção do Plano Piloto e os que são permanentemente utilizados para sua manutenção nos padrões definidos, fizeram (e fazem) com que o modelo experimental do novo Distrito Federal (o seu "Plano Piloto") se tornasse único e definitivo e termina por se apresentar ao restante do país, e do mundo, como a "capital do Brasil". Guardadas as devidas proporções, seria como se resumíssemos, por exemplo, o Rio de Janeiro à sua Zona Sul ou São Paulo à região dos Jardins. Tudo se passa como se déssemos o
privilégio a uma única área e, neste caso, a um único grupo social, o monopólio da representação de uma realidade social heterogênea. De qualquer forma, e de maneira ambivalente, o Distrito Federal tem neste “Plano Piloto” o elemento que o diferencia das demais cidades, portanto, ele ocupa importante lugar na sua própria consolidação como capital.
Esse imaginário também teve reflexos na produção acadêmica sobre a cidade. Alguns dos principais trabalhos sobre a nova capital, particularmente aqueles relacionados ao campo da arquitetura, concentram-se quase exclusivamente nas características do Plano Piloto
(HOLSTON 1993; CARPINTERO 1998; LEME, 1999). Uma das exceções a esta tendência é a “Coletânea Brasília”, organizada pelo professor Aldo Paviani e editada pela Editora da Universidade de Brasília. Nesta coleção, os autores vêm priorizando não apenas o Plano Piloto, mas também as cidades satélites (PAVIANI 1999, 2003 E 2005).
A CODEPLAN, órgão de planejamento do Governo Distrital, em um de seus últimos levantamentos oficiais, considera o Distrito Federal como a área composta por 28 “Regiões Administrativas”, além de Brasília. Estas RA’s refletem dinâmicas intra-distritais distintas e apesar de terem seus perímetros pré-delimitados legalmente, quando analisadas internamente são plenas de situações ambíguas. Uma análise um pouco mais apurada mostra que espaços enormes ainda sem legalização formal transformam uma boa parte do território do Distrito Federal em “terra de ninguém”, não se diferenciando de outras capitais brasileiras: os subúrbios formam-se muitas vezes sem controle e sem planejamento estatal. O inesperado no Distrito Federal é que tal fenômeno ocorra justamente num território escolhido, delimitado, desapropriado para sediar uma cidade capital.

Densidade populacional e densidade moral: a medida do social
O crescimento populacional do Distrito Federal é tema de inúmeras polêmicas: considerou-se quando de sua construção um número hipotético de 500.000 habitantes lançado como sendo o esperado para a sua população e, a partir daí, qualquer oportunidade é utilizada para criticar este número. Por um lado, há que se levar em conta que todas as estimativas de crescimento populacional no Brasil feitas na segunda metade do século passado foram ultrapassadas pelos fatos. Por outro, considerando-se que na época da construção da nova capital não se tinha o número exato de funcionários públicos que para cá seriam transferidos, é certo de que aqueles 500.000 foi um número absolutamente aleatório e sem a mínima consistência real (CARPINTERO,1998).
Mesmo assim, ou justamente por isso, é pertinente uma breve reflexão sobre os impactos da dinâmica (crescimento) populacional sobre a dinâmica urbana. Recorremos a Durkheim (1995) com sua tese sobre a densidade moral que uma sociedade atinge em função do seu crescimento
populacional. Argumentando sobre a mudança social que o crescimento no número de habitantes provoca, aquele autor insiste na diferença que existe quando estamos considerando sociedades calcadas em solidariedades mecânicas e solidariedades orgânicas. É justamente nestas últimas que o crescimento populacional faz aumentar a interdependência entre os indivíduos, intensificando as interações sociais. Seu argumento é de que em baixos quantitativos populacionais haveria maiores possibilidades de uma existência autônoma, tudo indicando que nestes casos os indivíduos prescindam dos demais para satisfação da maior parte do que necessitariam para viver.
Evidente que Durkheim quando elabora tais argumentos, de forma nenhuma os baseia numa fração da sociedade ou numa cidade especifica: sua visão é abrangente para o conjunto do social e do território. Entretanto, para nosso propósito estes argumentos podem ser úteis. Estamos tratando de um aglomerado que apresenta uma dinâmica demográfica com forte poder de atração de fluxos migratórios. Essa característica se manifesta de forma ambivalente. Por um lado, o volume de pessoas à procura de trabalho sendo superior à oferta de postos disponíveis gera um ambiente com elevada taxa de desemprego e, portanto, de desigualdade. Por outro
lado, o fato de termos um contingente populacional de relativo porte induz novas atividades, diversifica as já existentes e atua como fator de atração de novos migrantes. O fato é que as estatísticas apontam um vigoroso crescimento populacional do Distrito Federal após a inauguração de Brasília. De um espaço praticamente vazio, com vida social tipicamente rural, alcança-se, 47 anos depois, uma área urbanizada com mais de 2.000.000 de habitantes,
espalhados pelas 28 Regiões Administrativas, sendo que dessa população 29,9% é formada por indivíduos que se situam numa faixa etária entre 10(dez) a 24(vinte e quatro) anos, ou seja , cerca de um terço da população do Distrito Federal é composta por jovens. Como pólo atrativo de correntes migratórias, o Distrito Federal teve um crescimento explosivo nas décadas
de 1960/1970 e de 1970/1980 (respectivamente 14,4% e 8,2% a.a.). Embora a proporção de migrantes na população total seja muito menor que em 1970, em 2000, Brasília ainda exercia forte poder de atração, sendo que 19,1% de seu total populacional é não nativa com menos de 10 anos de residência. O fenômeno alcança tal dimensão que pensar Brasília significa refletir sobre dinâmicas conjunturais: a cidade é completamente distinta do que era há dez anos e provavelmente se distinguirá bastante nos dez anos vindouros face ao que ela é hoje. A metrópole se coaduna com a função de pólo de atração e pólo de fixação de migrantes, com área de influência ampla e difusa pelo território nacional, embora polarizando principalmente
migrantes de áreas limítrofes. Por outro lado, retomando os argumentos de Durkheim é possível
pressupor que o aglomerado humano em formação, no caso de Brasília, apesar de heterogêneo em qualquer perspectiva que se examine, detém a característica de, em sendo a capital política do país, apresentar segmentos modernizantes com forte capacidade de hegemonia. O aparelho
de Estado que se transfere para Brasília passa nas últimas décadas do século XX por processos de contínua transformação e atua como indutor de inovações que se espalham por todas as dimensões da vida urbana local. Ao mesmo tempo, o Distrito Federal vai constituir junto com a cidade de Goiânia um macro eixo urbano com potencial de expansão único dentro de
uma vasta Região do Brasil Central. São serviços especializados (universidades, centros de pesquisa, comércio diversificado etc) que atendem a um mercado de consumo com elevado poder de compra. O Atlas da Exclusão Social no Brasil coloca o Distrito Federal em terceiro lugar entre as cidades brasileiras com maior numero de famílias consideradas ricas, após São Paulo e Rio de Janeiro,. segundo o Atlas, cerca de 6% das famílias do Distrito Federal recebe mais de R$ 10,9 mil por mês. Os dados indicam que a renda média das famílias brasilienses mais abastadas é de R$ 40.787,90 mensais contra um rendimento médio de R$ 3.187,42 para todas as famílias. Com isso, o Distrito Federal tem a menor disparidade do país entre a renda da elite e o rendimento médio da população: 12,8 vezes para uma média nacional de 14,54 vezes. Tem-se assim uma franja importante do mercado consumidor com alto poder de compra, ao lado de outros extratos, os quais embora com menor poder aquisitivo, também participantes do mercado local. Os argumentos apresentados estão, portanto, calcados na premissa de que a circulação de moeda, ao lado do crescimento populacional, é fator de consolidação da vida urbana. Em outros termos, instaura-se um ciclo virtuoso entre crescimento populacional, expansão do mercado, diversificação de atividades e de vínculos, o que fortalece a tese durkheimiana.
Para efeito de análise, classificamos as Regiões Administrativas
(RA’s) do Distrito Federal em três faixas de renda familiar, segundo dados
da CODEPLAN/DF, obtendo-se o seguinte:


• A « Região Central » composta por Brasília, Lago Sul, Lago Norte,
Cruzeiro e Núcleo Bandeirante que apresenta os maiores níveis de
renda familiar (acima de R$ 3.401 reais);

• A « Região Satélite I » com as cidades de Taguatinga, Gama,
Sobradinho, Guará, Candangolândia e São Sebastião , cidades que
apresentam renda média entre R$1.100 reais e R$3.400 reais;
• A « Região Satélite II » com as cidades satélites de Brazlândia,
Paranoá, Planaltina, Ceilândia, Samambaia, Santa Maria, Recanto
das Emas e Riacho Fundo cidades cuja renda familiar chegaria até
os R$1.000 reais.

A classificação das Regiões Administrativas por « renda familiar » corresponde a uma ordem idêntica quando consideradas por renda « percapita »; as únicas exceções são Riacho Fundo e Ceilândia que pela renda familiar estariam na « Região Satélite II » e pela renda per-capita se
aproximam bastante da « Região Satélite I ». Qual seria a dedução mais óbvia que poderia ser retirada dos números acima? Sem dúvida, a enorme disparidade de renda entre a denominada « Região Central » do Distrito Federal e as demais Regiões Administrativas. Entre os extremos superiores de R$ 8.026,8 de renda familiar média e os R$ 2.007,0 de renda « per-capita
» do Lago Sul e os extremos inferiores de R$ 573,2 de renda familiar média e os R$ 140,3 de renda « per-capita » do Recanto das Emas se constata a enorme disparidade socioeconômica que se reproduziu no Distrito Federal à semelhança do restante da sociedade brasileira. Esta evidência, por si só, já é um excelente indicador do fato de que o Distrito Federal pode ser
considerado, em algumas de suas características, um microcosmo do país e de sua sociedade. Em outras palavras, tem-se indícios claros de que longe da idéia de « ilha da fantasia », o Distrito Federal reproduz, com requintes particulares, toda a complexidade social verificada em outras
cidades brasileiras. A « Região Central » se apresenta com elevado grau de homogeneidade quando analisada pela renda familiar e per capita. O Lago Sul, com os mais altos níveis de renda média (R$2.007,00), bem como Brasília, Lago Norte e Cruzeiro com níveis aproximados de renda média per-capita (em torno de R$1.100,00) constituem a área « nobre » do Distrito Federal. Poder-se-ia argumentar que esta Região Central é uma espécie de expansão do Plano Piloto tal qual imaginado na origem. Apenas o Núcleo Bandeirante apresenta renda per-capita de R$835,00: trata-se de antiga área popular para onde, uma vez inaugurada a cidade, foram
levados parte dos candangos da fase da construção, mas que, dada sua localização, absorve parcela de bairro nobre (Park-Way), o que eleva sua renda média. Claro que a concepção urbanística do conjunto da “Região Central” não guarda os mesmos princípios de Brasília, embora sejam áreas com refinado controle de ocupação e com estratégias planejadas de expansão, alto padrão das habitações unifamiliares, os códigos urbanísticos que priorizam a característica de « cidade jardim », a excelente infra-estrutura formam um conjunto de condições que terminam
por se agregar à representação simbólica da nova capital. Sem falsas ironias, pode-se considerar que está nessa área o sonho de espaço urbano civilizado, cosmopolita, “quase um boulevard europeu, clichê imaginado pelos idealizadores do projeto vencedor". A « Região Satélite I » é composta pelas primeiras e tradicionais cidades satélites do Distrito Federal. Muitas delas surgiram simultaneamente ao Plano Piloto, às vezes como resultado de políticas de expulsão de populações que vieram para a construção da cidade; outras foram se consolidando (Taguatinga) ou surgindo em decorrência da própria expansão do novo sítio urbano (Guará, Gama, Sobradinho). As duas únicas exceções são: Candangolândia, uma invasão que se consolida numa
localização privilegiada, praticamente colada ao Plano Piloto e, portanto, com um potencial de valorização imobiliária e São Sebastião, também privilegiada do ponto de vista da sua localização, na medida em que estando próxima do Lago Sul tem um mercado de trabalho assegurado,
sobretudo de serviços domésticos em geral. Nessa região também têm surgido inúmeros condomínios de classe média atraídos pela proximidade do Lago Sul muitos deles ainda em situação fundiária irregular. A « Região Satélite II », com exceção de Ceilândia e Planaltina, é formada por cidades satélites recentes (criadas nos fins dos anos 80 e na década de 90). É um
emaranhado de lógicas ocupacionais, muitas vezes selvagens, invasões que se consolidam a partir de articulações da população com forças políticas locais que vêm na indefinição das áreas públicas do Distrito Federal um instrumento privilegiado de consolidar seu « poder local ». Os dados evidenciam aquilo o que já é voz corrente: o crescimento populacional e a expansão da área urbana do Distrito Federal vêm se fazendo através da urbanização da pobreza que predomina em áreas geográficas próximas, como o sertão nordestino e algumas regiões de Goiás e Minas Gerais. Portanto, aqui estão populações oriundas de áreas rurais, ou semi-rurais, em geral com baixo grau de qualificação. Ao contrário das demais regiões, especialmente a «Região Central» aonde novos moradores vêm atraídos por empregos praticamente garantidos, a «
Região Satélite II » é constituída, na sua maior parte, por populações expulsas de suas áreas de origem que emigraram no intuito de se inserirem no mercado de trabalho local. O tombamento do Plano Piloto – medida polêmica mesmo entre profissionais do urbanismo e do desenho urbano – tem como conseqüência uma maior legitimidade à aplicação de instrumentos de controle de
expansão urbana ainda em curso. Ora, como iremos ver mais à frente no contexto de elevado crescimento demográfico, as cidades satélites tornam-se os verdadeiros centros desta dinâmica populacional. (O formulário de apresentação deste projeto não permite a inserção de tabelas e mapas para ilustrar os argumentos que estamos apresentando). A capacidade de atração de migrantes que o DF manifesta pode ser lida sob duas perspectivas. Em primeiro lugar, objetiva as forças sociais, isto é, torna visível sob a forma de regularidade fenomenal, a “resistência”
do fato social. Em outros termos, a massa de pessoas que abandonam suas origens em direção ao Distrito Federal é um fenômeno, antes de tudo, social, mais do que individual. Em seguida, pelo volume de migrantes que, de toda parte, se dirigem para Brasília, pode oferecer indicações das
transformações em curso nos lugares de origem. Ou seja, quanto mais uma prática se mostra regular, mais se pode pressupor que os processos em curso na origem são importantes. A migração em direção a Brasília é sempre forte e permanente; certamente isso mudanças importantes estão a ocorrer no conjunto das áreas polarizadas pela cidade. Entretanto, os dados estatísticos aqui utilizados não irão dizer nada desses processos na origem, somente apontar no lugar de destino, seus efeitos através suas regularidades, ou seja, não se irá aqui discutir as
razões desta decisão de migrar, apenas discernir o impacto na ocupação do território geográfico do Distrito Federal. A análise por cada segmento da classificação adotada anteriormente das RA’s permite lançar alguns elementos que podem ser úteis na decodificação da dinâmica espacial do
Distrito Federal. Ajuda em parte, como veremos na seqüência, na comprovação do pressuposto que estamos utilizando, de que o DF pode ser considerado um microcosmo do Brasil urbano.

Região Central
Na “Região Central” temos algumas peculiaridades. A RA de Brasília teve queda de população entre 1996 e 2000. Apesar de pequena (-0,5%) este fato seria absolutamente inesperado para um Distrito Federal que no conjunto, vem se caracterizando justamente por rápida expansão no
número total de habitantes: crescimento de 3% da população no periodo, ou seja, taxa próxima da média nacional. Claramente o acréscimo populacional verificado vem se dando de forma desigual dentro do espaço distrital. Assim, poder-se-ia levantar algumas hipóteses sobre as causas dessa diminuição de população em Brasília. Em primeiro lugar, o rígido controle de uso do solo engessa a expansão física da área. Após 47 anos de existência as últimas áreas ainda livres estão sendo rapidamente ocupadas com novas construções. Entretanto, isso por si só não está resultando em maior número de habitantes. Provavelmente os novos imóveis estão sendo
ocupados por moradores do Plano Piloto, por razões tais como, divórcios, separações, união entre pessoas que já moravam na área, etc. Tudo se passa como se tratasse de uma grande propriedade que vai sendo dividida entre os membros da família uma vez que atingem a maioridade. Um outro argumento pode ser o elevado preço dos imóveis aí situados, os quais
gozando de localização privilegiada e com condições urbanísticas excepcionais alcançam valores inatingíveis pela grande maioria das famílias no DF. De qualquer forma, trata-se de área tombada o que significa que sua população total pode ser matematicamente projetada, uma vez que os gabaritos dos prédios estão pré-definidos. O fato é que em termos de padrões habitacionais, a expansão da RA de Brasília vem se dando cada vez mais pela construção de novos imóveis com elevado padrão, independente do tamanho. O valor é estipulado pela
localização e mesmo os pequenos apartamentos ou os kits recentes nas entrequadras ou nas quadras 700 e 900 estão cada vez mais sofisticados. Esse fato é visível tanto na Asa Sul, mais antiga, quanto na Asa Norte, área ainda em expansão. Nesta última, os apartamentos têm mais liberdade de concepção estética, as entrequadras já não seguem o modelo das da Asa
Sul, transformando-se em área comercial e área residencial com seus pequenos apartamentos ou Kits. Este fenômeno é uma clara indicação de que houve problemas na concepção do espaço físico de Brasília, que com apartamentos programados para famílias (muitos deles chegam a ser
"excessivos" no tamanho) não previram a diversificação da oferta, ocorrendo uma demanda reprimida por imóveis menores. Nas palavras de um dos empresários do setor imobiliário local, “como faltam opções para orçamentos mais modestos em Brasília, as pessoas partem para o
improviso, que são as salas comerciais”. Mais uma vez o zelo com o Plano Piloto e a demora na aprovação de novos regulamentos para construção na área demonstram a dificuldade que é controlar espaços urbanos em sociedades de mercado. Ainda nesta Região Central, o Lago Sul também sofre os mesmos efeitos de queda de população entre 1996 e 2000, com diminuição de 0,7% entre 1996 e 2000. Esse dado chega a ser curioso. Em primeiro lugar porque esta área ainda conta com muitos espaços desocupados, terrenos baldios utilizados como especulação. Trata-se dos maiores preços de metro quadrado não construído do DF. Os imóveis já construídos são unifamiliares, praticamente todos de elevado padrão, cujos aluguéis são inacessíveis para a imensa maioria do funcionalismo público. O perfil dos habitantes do Lago Sul é formado por políticos, profissionais liberais, funcionários de embaixadas, e óbvio, funcionários públicos da alta
hierarquia do Estado ou aqueles que compraram terrenos antes da super valorização da área. Recentemente sua ocupação vem se diversificando com a construção de pequenos núcleos de comércio local e mini-shoppings para atendimento desta população de maior poder aquisitivo do DF. Logo, a pequena queda verificada na população residente pode ser imputada a fatores conjunturais ou pela supervalorização dos imóveis. De fato, o crescimento populacional observado na Região Central do Distrito Federal é responsabilidade do Lago Norte e do Cruzeiro. O Lago Norte, na sua área nobre com perfil aproximado de população do Lago Sul
e Plano Piloto, incorpora na sua população total os habitantes do Varjão (área consolidada de invasão popular) e um pequeno trecho onde se instalam algumas empresas e se constroem pequenos edifícios de apartamentos menores que aqueles do Plano Piloto. Certamente o pequeno aumento de população da área é devido a estes dois fatores. O Cruzeiro incorpora na sua população total a expansão do Sudoeste, área recente de edifícios habitacionais, onde a classe média que não conseguia acesso a imóveis no Plano Piloto – ou no padrão desejado ou pela pequena oferta - opta pelos novos apartamentos com gabaritos modernos que fogem ao
tradicional das Asas Norte e Sul. Nos anos noventa foi nesta área que mais se construiu para a classe média no Distrito Federal. A análise acima mostra um aspecto curioso: a população da Região Central do Distrito Federal tem um crescimento absoluto praticamente vegetativo no período. Claro que se trata de um curto espaço de tempo (1996-2000). Entretanto, esse é um tempo importante para uma cidade que tem apenas 47 anos de existência. A taxa de média de crescimento geométrico é de 5,13%. Essa taxa é muito menor do que as observadas para o DF no seu conjunto. As razões para isto podem ser o baixo nível de novas contratações na administração pública nos anos recentes, a dificuldade de se morar na área dado o elevado preço dos imóveis e dos aluguéis, ou mesmo porque, a mobilidade social no Brasil é estreita e isto
se reflete nestes dados, a nível local. O conjunto dessas alternativas é que poderia explicar esta situação. O tombamento do Plano Piloto, de qualquer forma, engessou a expansão física da área e dificultou qualquer tentativa de alterar alguns dos pressupostos do Plano original. É nas cidades
satélites que acontecem as novas dinâmicas de expansão urbana do Distrito Federal.

Região Satélite I
Caso fosse possível aplicar a expressão “área nobre” para as satélites, certamente as cidades aqui listadas seriam incluídas. Em primeiro lugar, pela localização dentro do DF: limítrofes do Plano Piloto se beneficiam das inúmeras vantagens que este aspecto concede, o principal deles é justamente o mercado de trabalho. No Distrito Federal, Brasília concentra mais de 70% dos empregos formais o que quer dizer uma fantástica concentração espacial de postos numa única área, talvez a mais expressiva dentre as grandes cidades brasileiras. Ao mesmo tempo e em
decorrência desta localização são servidos por amplas vias de tráfego e pelos melhores e relativamente mais baratos serviços de transporte público do Distrito Federal. Como as inovações que ocorrem no DF começam em Brasília para depois se estenderem às satélites, o sistema de transporte reflete esta situação: a única linha de metrô existente até o momento liga uma boa parte destas satélites com o Plano Piloto. Finalmente, em termos relativos, os imóveis são bem mais acessíveis tanto para compra como para aluguel, o que termina por absorver uma parcela da demanda que não tem condições financeiras de morar em Brasília. Das seis R.A.’s que compõem esta área, duas chamam a atenção pelo crescimento populacional: Sobradinho e São Sebastião. Sobradinho sem dúvida apresenta este elevado percentual de crescimento (média
geométrica de 6,23%) graças à expansão dos condomínios que, pouco a pouco, ocupam praticamente todo o espaço físico desta satélite. São em geral áreas ainda não regularizadas, habitadas por uma classe média, composta na maioria por funcionários públicos. São Sebastião,
inicialmente, foi área de expansão por invasões, mas hoje está regularizada. Habitada por uma população de migrantes com menor qualificação atende, sobretudo o mercado de trabalho do Lago Sul (sobretudo domestico). A exemplo de Sobradinho, em São Sebastião é a expansão dos condomínios de classe média que responde pela elevada taxa de crescimento geométrico anual de 9,81%. Taguatinga, Gama e Guará são cidades tradicionais do DF. Apresentam um processo já acentuado de verticalização das construções, assumindo ares de grandes cidades, sobretudo Taguatinga, Guará e Gama. A área de Águas Claras em Taguatinga é responsável pelo elevado
aumento de população relativa no período, transformando-se numa expansão de classe média com apartamentos com gabaritos acima dos do Plano Piloto. Neste particular destoam do restante das satélites onde as habitações unifamiliares ditam o perfil das moradias. Ao mesmo tempo apontam para esta tendência a verticalização tendo em vista o rígido controle pelos ambientalistas, transformando em item raro um bem que era abundante há poucos anos atrás: a terra urbana. Dada a diversidade de renda familiar, de padrões habitacionais, de ocupação profissional dos moradores, há claras indicações de que é nesta área que se constrói uma vida urbana na perspectiva sociológica, ou seja, diversidade sócioeconômica e individualização. A taxa média geométrica de 30,21% observada nesta Região mostra uma dinâmica populacional bastante superior à da Região Central. Pode-se dizer que o crescimento populacional desta região corresponde ao deslocamento de famílias de classe média da região central e satélite II para essas novas áreas de expansão imobiliária.

Região Satélite II
As cidades satélites aqui classificadas são as principais responsáveis pelo crescimento populacional do Distrito Federal, muitas delas apareceram nos fins dos anos 1980 e na década de 1990. São famílias que chegaram ao Distrito Federal atraídas pela imagem que a cidade se
apresenta ao restante do país, bem como pela sua proximidade geográfica. Uma rápida verificação nas condições materiais de uma vasta região interiorana limítrofe tanto no Centro-Oeste como no Nordeste (Sertão) e parte do Sudeste (sobretudo as bordas mineiras com o Centro-Oeste) pode comprovar déficits em inúmeros serviços coletivos (educação, saúde,
habitação, etc). Brasília tem estoque razoável destes serviços, além do potencial de empregabilidade que apresenta. Esta Região Satélite II conta com características heterogêneas nas dinâmicas populacionais. Ceilândia, por exemplo, é uma tradicional cidade do Distrito Federal, resultado de expulsões de candangos que vieram para a construção da cidade nos anos 1960 e que adquire dinâmica autônoma acolhendo posteriores migrantes que se dirigem para o Distrito Federal. Os seus 344.039 habitantes em 2000 fazem dela a maior das cidades desta
Região, embora sua expansão esteja praticamente estabilizada. Limítrofe de Taguatinga e de Samambaia, forma no conjunto um denso aglomerado populacional no Distrito Federal. Planaltina é anterior à construção de Brasília e está demonstrando ainda importante capacidade de atração de população (taxa geométrica de crescimento de 6,02%). Entretanto, das cidades satélites que compõem esta Região II, o grande destaque é Riacho Fundo (taxa geométrica de crescimento anual de 17,987%) e Recanto das Emas (taxa geométrica de 15,92%). Os dados que estão sendo utilizados nesta análise não dão conta da recente dinâmica intra-urbana da população do Distrito Federal. Observações in loco, por exemplo, mostra uma expansão intensa de condomínios em áreas ainda desabitadas, além de invasões de populações carentes (por exemplo, a área de Itapoã no Paranoá) o que confirma a afirmação anterior de que trabalhar a realidade do Distrito Federal é refletir sobre conjuntura.
Constatações dessa ordem colocam ao estudioso do espaço social da cidade questões que merecem um melhor aprofundamento. Quais são os espaços de uso coletivo que se colocam dentro deste microcosmo urbano? Qual a especificidade da população que freqüenta esses espaços? Existem projetos que visam a integração social da juventude sendo desenvolvidos
nesses espaços? A resposta a tais questões pode ser procurada por dois caminhos: em um levantamento acurado destes espaços, bem como um mapeamento das atuais políticas públicas voltadas à juverntude do Distrito Federal de forma a analisar em que medida esses programas sociais desenvolvidos na cidade permitem à população jovem manter-se afastada de situações de risco. Em outras palavras qualitativamente pode-se explorar pistas a partir da identificação desses espaços e de sua caracterização que esclareceriam com maior pertinência aspectos
significativos da lógica social instaurada na cidade no que se refere a inserção cidadã da juventude. No Distrito Federal são 626.778 jovens, os quais representam 29,9% da população total dessa região. (PDAD, SEPLAN/CODEPLAN, 2004).
Mapear os espaços e equipamentos de uso coletivo no espaço urbano do DF é também traçar um balanço das políticas públicas destinadas aos jovens em Brasília é voltar o olhar para o que foi feito e considerar um conjunto de iniciativas que merecem ser avaliadas para se evitar práticas que reiterem alguns dos desacertos que possam existir. O presente projeto é um esforço de compreensão abrangente, de modo a situar, com base em caminhos percorridos nos últimos quatro anos no que se refere às iniciativas focalizadas nos segmentos juvenis da sociedade
brasiliense. Para tanto, a partir de algumas considerações em torno do tema “cidade, espaços e equipamentos públicos de uso coletivo, Juventude e políticas públicas", examinaremos os espaços públicos de uso coletivo e as ações do governo local para traçarmos quais caminhos foram percorridos no âmbito do Distrito Federal em direção à constituição dessas políticas para propor estratégias e mecanismos adequados às demandas e necessidades da juventude no espaço urbano.

2. Justificativa
A proposta deste projeto contempla o estudo da relação entre cidade, espaços e equipamentos públicos de uso coletivo, Juventude e políticas públicas para o enfrentamento do problema referentes aos riscos sociais que submetem populações urbanas a fenômenos como insegurança, violência e marginalidade, sobretudo nas camadas mais jovens. A dinâmica citadina, embora complexa, é composta de espaços públicos dos quais qualquer indivíduo tem o direito de usufruir. A relação de pertencimento do jovem ao lugar onde vive a partir do acesso, disposição de espaços para manifestações de suas capacidades, habilidades, vontades, opiniões, expressões culturais e artisticas é fundamental que ele possa se sentir protagonista e não apenas espectador em processos da vida social sediados em espaços da cidade. Esses lugares são instâncias de socialização pelas quais o jovem passa e forma sua visão de mundo, constituindo sua malha referencial. O acesso indiscriminado a espaços coletivos na cidade propiciam à juventude oportunidade para desenvolver suas capacidades crítica, criativa e no limite, sua própria
autonomia.
A população jovem se caracteriza por uma faixa da população que ainda não estaria completamente inserida na lógica de mercado, mas que, vivendo em cidades, vai sendo paulatinamente socializada para adquirir esta cultura urbana. O recorte geracional pode nos ajudar na compreensão de processos de formação da uma pretensa “mentalidade urbana” presente no clássico texto de Simmel (1974). Estamos nos referindo à categoria juventude, um grupo que não sendo mais criança, tampouco é adulto. Situando-se naquela fase intermediaria entre uma faixa e outra, desenvolve certos hábitos de vida peculiares e a natureza dos vínculos que constroem ilustra as possibilidades de existência social, onde a regulação das relações não é ainda à dominante monetarizada.
Subjacente à opção pelo recorte geracional há questões que nos orientam nas reflexões sobre a vida urbana: seria o processo de socialização por que passam estes jovens algo especifico à esta condição de precariedade? teríamos conteúdos especiais nesses mecanismos de socialização que estariam criando indivíduos peculiares? Responder a estas indagações vai nos exigir percorrer algumas etapas no sentido de problematizar a categoria juventude neste contexto. Essencialmente evitaríamos o risco de tratarmos “juventude” como uma categoria universal, naturalizada e descolada das condições objetivas de sua existência. As dinâmicas sociais que se rebatem no espaço urbano geram contextos hierarquizados, nos quais se redefinem a natureza e a forma da subordinação e logo dos conflitos e da integração. Esta lógica se manifesta entre os jovens segundo mecanismos peculiares, dentre esses mecanismos
interessa a este projeto identificar os espaços públicos e os equipamentos urbanos disponíveis a essa parcela da população no Distrito Federal. Refletir sobre o uso desses espaços e equipamentos públicos pode constituir uma oportunidade especial para refletirmos sobre a relação individuo e sociedade, nos esclarecendo sobre características da vida urbana na nossa cultura.
A natureza heterogênea de nossas metrópoles implica a coexistência de códigos e lógicas distintos que são geradores de tensões e conflitos entre os diferentes segmentos e onde mundos díspares coexistem em espaços relativamente restritos. Em outras palavras, podemos considerar que nos contextos metropolitanos ao invés da coexistência de dois mundos ou duas lógicas sociais1 observa-se diferentes domínios e níveis sócioculturais. Essa realidade gera um espaço urbano com escalas ampliadas e uma heterogênea mobilidade material e simbólica pelos espaços urbanos existentes na cidade.
Dessa forma, a diversidade temática dessa composição dos espaços públicos potencializa em grau variado, o que configura um cenário importante a ser pesquisado no DF. Esta investigação pode permitir a análise concreta da heterogeneidade e complexidade da composição desse segmento social, bem como é possível detectar a eficiência ou não das
políticas públicas desenvolvidas para esse segmento populacional, pois o mapeamento desses espaços e equipamentos urbanos no DF permite a possibilidade de avanços no entendimento das características e necessidades atuais desse extrato populacional e de sua atuação na
sociedade. Entende-se aqui que são nesses espaços onde as articulaçoes societárias ocorrem permitindo o encontro de projetos a serem implementados para a formação desses indivíduos. A cidade ao dispor desses espaços e equipamentos públicos imprime uma relação entre a sociedade e a cidade de maneira que a primeira se reconheça no interior de um quadro de alteridade sendo então capaz de pleitear numa construção negociada com o Estado a emancipação desses jovens. Por isso, acredita-se aqui ser importante dimensionar em que medida esses espaços existem, como são utilizados, por quem e principalmente se o segmento jovem usufrui desses espaços? E se são atendidos, de que maneira estão sendo atendidos?
Não se pode esquecer que há uma relação direta entre poder publico e população no sentido de viabilizar o uso da cidade e vamos avançar um pouco mais a dimensão deste uso. Apesar de espaço coletivo, o uso da cidade é seletivo e tem lógicas pertinentes à condição de ocupação do território e à forma como o Estado (poder local) interage habitantes, atividades econômicas e demais interesses.
Ao mesmo tempo, a infra-estrutura urbana, pela sua própria característica de indivisibilidade não pode ser completamente absorvida pela empresa privada. Essa indivisibilidade determina o consumo dos bens coletivos (ruas, praças, áreas publicas) os quais acessíveis a todos faz de cada cidadão urbano um consumidor da cidade, em estreita relação com aquilo que é oferecido pelo setor publico. Paralelamente, o mercado cria critérios próprios de acesso e consumo de espaços urbanos, transformando-os em mais um mecanismo classificatório2. Assim, podemos considerar que de forma ambivalente todos, independente da posição social, detêm uma parcela de autonomia para uso da cidade, seja pela indivisibilidade da infra-estrutura, seja pelos mecanismos de mercado.
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1 As clássicas dicotomias da sociologia: formal/informal, incluído/excluído, moderno/tradicional, etc.


Referências Bibliográficas

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LEME, M. C. da S. (coord.) Urbanismo no Brasil (1895-1965). São Paulo,
Studio Nobel; FAUUSP; FUPAM, 1999.
2 - Certas áreas urbanas apesar de “publicas” não esta acessíveis a qualquer um em qualquer momento. As
restrições no uso e consumo de certas áreas é uma regra corriqueira e atinge todos os grupos sociais.
23
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In, Revista Urbanidades, Vol II, 2005. Disponível em
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migratórios para o Aglomerado Urbano de Brasília. Trabalho apresentado
24
no XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais ABEP, Caxambu – MG
setembro de 2006.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Resenha de "O urbanismo como modo de vida", por Paloma Karuza Maroni da Silva.

Resenha do texto: WIRTH, Louis: O urbanismo como modo de vida. In Velho, Otávio (org.), O Fenômeno Urbano, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editora, 1979.

1) Idéia central:

Louis Wirth apresenta nesse texto uma definição sociológica de cidade, fundamentada nas relações entre a quantidade, densidade e relativa permanência da população e a heterogeneidade dos habitantes da cidade. A partir dos postulados implícitos no conceito de cidade, o autor propõe a formulação de hipóteses acerca das formas de organização social e de ação características da vida urbana, visando a construção de um corpo teórico da sociologia urbana por meio de sucessivas elaborações teóricas e aplicação de pesquisas empíricas.

2) Principais conceitos utilizados:

- modo de vida; urbanismo; densidade; civilização; urbanização; cidade; personalidades urbana e rural; processo de interação; diferenciação social; heterogeneidade; tradição folk; status flutuante; sistema de comunicação; tecnologia de produção.

3) Síntese:

O autor começa por estabelecer a relação histórica entre a cidade moderna e o complexo de idéias, práticas e códigos sociais que chamamos de civilização. O urbanismo é apresentado como um complexo de caracteres que formam o modo de vida tipicamente urbana. Um desdobramento desse conceito é que não se pode mensurar o grau de urbanidade da civilização contemporânea pela simples determinação da proporção da população que habita as cidades. A influência do modo de vida urbano está além dos limites da cidade, expansão que só é possível pelas intensas trocas proporcionadas pelo sistema de comunicação e pela adoção generalizada da tecnologia e das relações sociais de produção modernas. É importante lembrar que os espaços rurais não estão isolados do centro urbano, ao contrário, a lógica urbana integra os diversos setores da sociedade, incluindo as áreas rurais, em seu universo político, econômico, cultural e social. Portanto, é impossível falar em cidade pura ou em campo puro, ambos são tipificações ideais de formas de comunidades e de relações sociais. A realidade abriga diversas gradações que se encontram entre esses tipos extremos.
Percebendo a arbitrariedade de se definir uma comunidade como sendo urbana fundamentada apenas no tamanho da população ou em sua densidade, o autor propõe que se faça referência a características sociais significativas na conceituação do urbano. Há dessa forma uma diferença entre a definição sociológica de cidade e seus limites administrativos ou legais captados pelo recenseamento urbano. Nas palavras do autor, sua definição de cidade: “(...) um núcleo relativamente grande, denso e permanente, de indivíduos socialmente heterogêneos” (p. 96).
Algumas proposições derivadas do conceito de cidade são levantadas pelo autor. Quanto maior a heterogeneidade e densidade da população, mais intensamente se manifestarão as características do urbanismo. O grau de interação social também é uma variável importante, quanto maior for o número de indivíduos se relacionando na sociedade, maior será a diferenciação potencial entre eles. O autor também aposta na continuidade de algumas tendências, como o desaparecimento da tradição de folk e da significação dos vínculos de parentesco e da família como instituição central.
O aumento do número de habitantes interagindo modifica a forma das relações sociais, que tendem a transitoriedade, superficialismo, fragmentação e anonimato. As relações sociais passam a se pautar na lógica utilitarista, devido à pressão da divisão do trabalho e da especialização dos indivíduos. A forma política característica do modo de vida urbano é o sistema representativo. Assim, o indivíduo precisa se articular em diversos grupos de interesses para se valer na arena política e social.
A densidade populacional tende a vir relacionada com a diferenciação social e os grandes contrastes urbanos, tanto de natureza econômica como social e cultural, o que pode potencializar tensões nervosas. A distribuição dos diferentes grupos na cidade não ocorre por acaso, obedece a uma lógica urbana de classificação, seleção e alocação de indivíduos, recursos públicos, instituições e serviços. Essa lógica está relacionada a vários fatores como o mercado de consumo e de mão-de-obra. As diferentes localidades acabam por se inserir na lógica urbana de formas variadas, surgindo assim as desigualdades regionais e dominância dos centros urbanos. A mobilidade seria outro traço marcante do modo de vida urbano, manifestando-se no status flutuante do sujeito no meio sócio-econômico, no elevado grau de renovação dos membros dos diferentes grupos e nas mudanças contínuas de residência e local de emprego.

4) Comentários, dúvidas e ou críticas:

O autor incorre em vários erros ao derivar características do modo de organização urbana do conteúdo esquemático do conceito de cidade. Ele acaba naturalizando a vida urbana e ao mesmo passo idealizando-a. Para ele, a cidade “não só tolerou como recompensou diferenças individuais. Reuniu povos dos confins da terra porque eles são diferentes e, por isso, úteis uns aos outros e não porque sejam homogêneos e de mesma mentalidade” (p.98). Do postulado da heterogeneidade como caráter urbano, Wirth formulou várias de suas hipóteses, como a tendência da especialização dos indivíduos, inspirada na teoria de Durkheim da divisão do trabalho social, como seu conceito de solidariedade orgânica. Em termos durkheimianos, quanto maior o volume, a densidade moral e material da sociedade, maior a pressão pela divisão do trabalho social. A partir dessas idéias, o autor supõe uma lógica implícita da cidade: o diferente é bom, uma vez que é útil, e portanto tende a ser respeitado e tolerado no meio urbano. Essa idéia carece de verificação empírica. Ao mesmo tempo em que os centros urbanos são relacionados à diversidade e maior tolerância, também são relacionados às desigualdades sociais, marginalização de grupos e intolerância frente a outros, minoritários ou não.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Resenha de "Migrações internas: considerações teóricas sobre o seu estudo", por Louíse Neves Silva.

Resenha do texto: SINGER, Paul. Migrações internas: considerações teóricas sobre o seu estudo. In: “Economia Política da Urbanização”. São Paulo: Editora Brasiliense; 1975.

A idéia central do texto é que as migrações internas são decorrentes tanto de aspectos históricos e institucionais como de mudanças estruturais e espaciais da economia. Devem ser vistas sob a ótica de um processo global, sendo caracterizadas como um processo social em que a unidade atuante não é o individuo, mas o grupo e/ou classe social. Assim, o autor estabelece estreita relação entre migrações e industrialização.
O autor vai tecendo algumas hipóteses e constatações ao longo do texto. Primeiro, formula a “hipótese da existência de tipos historicamente definidos de migrações, condicionadas pela industrialização”(p.29). A industrialização modifica as técnicas de produção e a divisão social do trabalho. A transferência de atividades do campo para a cidade faz parte da exigência técnica da produção industrial. A concentração de capital leva à aglomeração espacial das atividades e à urbanização, mas as características institucionais e históricas devem ser levadas em conta. A industrialização não é um processo espontâneo, mas é influenciada por arranjos institucionais que agem na dinâmica econômica.
Outro ponto destacado, as desigualdades regionais são as grandes propulsoras das migrações internas ligadas à industrialização. Assim, o autor fala de fatores de expulsão que levam às migrações: os fatores de mudança e de estagnação. Os fatores de mudança fazem parte do próprio processo de industrialização e provoca uma emigração ampla, diferente dos fatores de estagnação, mas os dois se referem às áreas rurais e ao fluxo de pessoas. O quadro institucional pode ser usado a fim de levar ao desenvolvimento regional de áreas estagnadas, desequilíbrio “criado pelo próprio processo de industrialização institucionalmente condicionado”(p.39)
O autor aborda sobre os fatores de atração que orientam os fluxos migratórios, sendo a demanda por força de trabalho a mais importante. Tece 3 hipóteses sobre o fato de numerosos migrantes não serem absorvidos pelo mercado de trabalho: inferioridade econômica, desqualificação e desequilíbrio entre oferta e demanda. Esta última é a apoiada. A procura de força de trabalho nas cidades é uma “função do tamanho e da composição do produto gerado pela economia urbana” (p.43).
O poder das transformações tecnológicas e de seus efeitos socioeconômicos é muito maior nos paises não-desenvolvidos. Nestes paises há um “Setor de Subsistência” ainda forte que é transposto para a economia urbana: serviços domésticos, ambulantes, trabalho informal. Isto porque o fluxo migratório à área urbana é produzido em grande parte por fatores de estagnação.
O autor discute a questão da marginalidade urbana que é caracterizada por desníveis econômicos e tensões sociais, frutos do desenvolvimento “para dentro”, pois o comércio exterior não funcionou dinamicamente como nos países desenvolvidos. A marginalidade não decorre do excesso de migrantes, mas pela relação entre fluxo migratório e economia urbana. Para o autor, se a migração interna é um processo social, possui causas estruturais. Há uma seletividade objetiva de fatores de expulsão adicionada a motivações subjetivas. Os fatores estruturais que determinam o desdobramento das migrações no espaço e no tempo. O autor fala que o impacto econômico, social e político da migração no lugar de destino deveria ser encarado como parte do processo de transformação das estruturas sociais e, para isso, é importante estudar as migrações pelo ângulo de classe, da formação do exército industrial de reserva e dos laços sociais entre migrantes novos e antigos. Também convém estudar os fatores de atração do meio urbano sobre os migrantes.
Os conceitos usados pelo autor que dão base à sua argumentação são: marginalização/marginalidade, oferta, demanda, mercado de trabalho, força de trabalho, divisão social do trabalho, migrações internas, fatores de expulsão, de mudança, de atração e de estagnação, desenvolvimento regional, configuração histórica, arranjo ou quadro institucional, economia urbana, concentração espacial, industrialização, desemprego tecnológico, produtividade, especialização, mudanças técnicas, estruturas sociais e econômicas, classe, exército industrial de reserva, entre outros.
O autor remete à questão dos limites da configuração histórica nas migrações internas, mas parece que ele vai analisar este aspecto só quando fala das diferenças entre países desenvolvidos e não-desenvolvidos, se atendo mais a aspectos econômico-institucionais quando fala das migrações internas em si. O livro em que se encontra o texto é sobre a “economia política da urbanização”, mas não me agrada uma abordagem tão centrada na economia (que pela relação direta entre migração-industrialização, explícita pelo autor, faz todo sentido). Singer pouco se detém no que sugere no final do texto, a própria dinâmica social da migração - os laços sociais entre migrantes e os fatores de atração.

domingo, 27 de abril de 2008

A Brasília de Danuza, por Brasilmar Ferreira Nunes.


O artigo da colunista Danuza Leão neste domingo (Folha de São Paulo: 23/03/08) nos brinda com uma análise curiosa dos políticos e, termina expressando um desejo um pouco parecido com a rotina em algumas favelas do Rio de Janeiro: “a vontade que dá é de jogar uma bomba – várias aliás – e acabar com Brasília”(sic). A proposta é no mínimo curiosa na medida em que é feita por uma moradora daquela cidade que, apesar de ter mais funcionários públicos no Brasil (mais do que Brasília), mesmo assim, vive afundada em mazelas de toda ordem, inclusive entre seus políticos. Significa no mínimo que, em deixando de ser capital federal e, portanto, abrindo mão dos parlamentares federais no seu território, inclusive explodindo o Palácio Monroe para não deixar vestígios desta gente, tudo continua como antes na terra de São Sebastião.
A nova capital, em tão pouco tempo, transformou-se numa das referências da tão procurada identidade nacional, mesmo se um pouco profana, pois construída em pleno século XX, longe das influências de elites históricas ou de tradições, algumas delas duvidosas, surgindo no meio do nada. Talvez seja esse descompromisso com os padrões estabelecidos que permitiu esta verdadeira heresia: tirar o título de capital do país do Rio de Janeiro, que embora já o tivesse tirado de Salvador da Bahia, o fez na época segundo os cânones então legítimos. Brasília é inovadora também por isso: feita com base em princípios racionais de desenho e... suprema heresia, sem história. Aparece no imaginário como a vontade exclusiva de um político do interior do Brasil, talvez dotado de uma premonição um pouco fora da média, enfrentando o descrédito quase generalizado de todos, com exceção talvez dos que ali viam a possibilidade de emprego, os candangos.
Assim, passado esses anos, algumas representações sobre Brasília já deixaram de ser levadas a sério pelos de bom senso. Sem bairrismos de boteco, talvez a real ilha da fantasia no Brasil esteja ainda no Rio de Janeiro mostrado pelos meios de comunicação, nos festejos carnavalescos, nas telenovelas, na escolha da musa de verão, na propaganda de bebidas.... Neste ano em que se comemora a chegada da Corte no Rio de Janeiro, quando livros e pesquisas aparecem mostrando o real significado daquele desembarque apressado, o Rio colonial é mostrado sem as cores da tv. Talvez apontando que a sua história é também plena de pontos obscuros. Hoje a cidade se transformou num balneário que vive entre as guerras de quadrilhas e a rotina de uma precariedade urbana lastimável para quem já foi capital do pais. E tudo isso sem os parlamentares federais enviados de presente para o Planalto Central. Ilha da fantasia, por exemplo há muito deixou de ser uma metáfora adequada para caracterizar Brasília, mesmo se povoada também por políticos das mais variadas origens, inclusive carioca.
Não se pode, porém dizer que Brasília, às vésperas de completar 48 anos, seja exatamente uma senhora, que se ofendesse com essas pulsões. Pulsões essas meio inesperadas para alguém que escreve manuais de boas maneiras e conta quase tudo sobre sua proximidade ao longo da vida com certa elite nacional. Digamos que balzaquiana seja um termo mais apropriado para nos referirmos a Brasília, sobretudo nesses tempos em que a esperança de vida está prolongando a da média da população. Assim, sem dúvida um certo rubor na face, nada mais que isso é o que a cidade sente.
Brasilmar Ferreira Nunes é professor do Depto de Sociologia da Universidade de Brasília. Pesquisador do CNPq.

Brasilia – quase meio século, por Brasilmar Ferreira Nunes.


De maneira recorrente, as críticas sobre Brasília insistem sobre o desenho da cidade, caindo num senso comum repetitivo e cansativo. Nessas criticas, o espaço físico, o desenho da cidade, o seu plano urbanístico é o foco: não tem praças, não tem esquina, não tem calçada, não tem o boteco do bairro, não tem praia, e assim por diante. Como toda análise rápida e ordinária cai-se na armadilha de dizer o que ela não é, ao invés de dizer o que ela é.
Brasília faz 48 anos. Tempo longo se pensarmos no que era o Brasil dos anos 50/60 do século passado, porém irrisório se pensarmos nos longos ciclos da história universal e mesmo brasileira. Documentos oficiais nos lembram que a cidade foi pensada como um marco nacional permanente, algo assimilável nestes termos ao Hino Nacional e à Bandeira, tendo como função principal representar o país para si mesmo. Podemos afirmar que o papel de capital política do país está devidamente consolidado. Isso pode ser demonstrado por diferentes análises. Basta lembrar que uma manifestação política na Esplanada dos Ministérios repercute com muito mais força do que em qualquer outro espaço urbano do país, conseguindo, portanto, num curto período de existência, adquirir a centralidade política que extravasa a função administrativa do Estado e alcança a dimensão simbólica do fazer política. . O fato de ter sido construída para ser capital política já lhe garante um lugar privilegiado dentre as cidades brasileiras e o seu desenho só viria a somar a esta importância que é concreta.
Trata-se de uma cidade que por suas funções não necessita disputar lugar com outros sítios: sua importância lhe é inerente. Caso exemplar do urbanismo do século XX é tombada pela UNESCO como “Patrimônio Cultural da Humanidade”, quando ainda estava para completar seus 30 anos de existência. Estamos beirando os dois milhões e meio de habitantes, dos quais, aproximadamente 15% estão neste Plano Piloto de origem. Os demais estão espalhados por cidades satélites, numa conformação polinucleada, de tal forma que à primeira vista parecem independentes entre si. Entretanto, Brasília (Plano Piloto) concentrando cerca de 70% do emprego formal transforma uma boa parte das satélites em cidades dormitórios, numa dependência visceral do Plano Piloto, rapidamente adquirindo status de centralidade.
Os critérios utilizados para classificar a área tombada ficaram distantes daquela que comandava os debates sobre um possível tombamento de Brasília nos fins dos anos 70 e anos 80 quando se discutia a sua pertinência e viabilidade. Poderíamos destacar, por exemplo, a constituição de um grupo interinstitucional formado por professores da Universidade de Brasília, técnicos da Fundação Nacional Pró-Memória (Ministério da Cultura) e o Governo do Distrito Federal , grupo este denominado “Grupo de Trabalho para a Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Natural de Brasília (GT-Brasiilia)”, cujas primeiras discussões são já dos fins dos anos 70. O objetivo era traçar e definir parâmetros para a política de preservação do patrimônio do Distrito Federal. Analisando documentos técnicos e acadêmicos produzidos pelo grupo constata-se uma concepção de patrimônio presente naquele momento envolvendo a paisagem original e pequenos povoados pré-existentes à cidade. Entretanto, o discurso da arquitetura aplicado a Brasília ganha força com a passagem de Lucio Costa pela cidade em 1987, pouco antes de seu tombamento: há neste momento um retorno à hegemonia do desenho sobre os aspectos culturais defendidos pelo GT-Brasilia.
Levanto tais questões de forma ampla apenas para ressaltar que a cidade cresce através de dinâmicas múltiplas, gerando um espaço social a velocidades variadas. Entre o urbanismo de primeiro mundo que caracteriza a área nobre da cidade e as leis de mercado, às vezes selvagem de ocupação do solo em várias satélites, são realidades distintas que se apresentam para um observador mais atento. Por um lado, o tombamento freia forças de mercado que poderiam descaracterizar o desenho original, dando a impressão de que se engessou o espaço transformando-o em um museu dos anos 50. Por outro, as satélites gozando de uma liberdade relativa e povoada por grupos de múltiplas características, produz espaços urbanos e culturais com enorme dinamismo. Veja por exemplo, as práticas culturais de jovens de Ceilândia ou de Taquatinga, a formação de torcidas organizadas de futebol, o culto a tradições populares da cultura brasileira como o carnaval, tudo acontecendo com muito mais evidência nas cidades satélites.
Uma rápida olhada nas transformações do espaço no Plano Piloto revela uma dinâmica intimamente adaptada às novas modalidades do mercado de cidades no plano nacional e internacional. Os equipamentos de consumo que são permanentemente construídos são padronizados para atender a um gosto de classe que tem que se sentir integrada numa modernidade clichê: são shopping centers, equipamentos culturais, hotéis, aeroporto, parques, museus, cinemas, todos em continuo processo de implantação e multiplicação guardando sempre os padrões da estética globalizada e sua lógica de uniformização da sensibilidade.
Enquanto isso, nas satélites apesar de certo ar de improviso na estética urbana aí presente, sente-se uma vibração que, apesar de discreta, revela muito das expectativas dos seus moradores. Um mercado habitacional super dinâmico, uma variedade de comércio típico de áreas com renda heterogênea e uma espécie de otimismo velado que é próprio de áreas com elevados índices de mudança.
Há portanto no caso de Brasília uma interessante oportunidade para se refletir sobre o espaço construído como síntese de uma sociedade. Ao mesmo tempo, o peso simbólico do Plano Piloto fortalecido no conceito de patrimônio cultural auxilia nesta distância social assimétrica à realidade das cidades satélites, oferecendo as bases para a idéia de memória nacional que se apresenta, de fato, altamente seletiva. Neste caso, “patrimônio cultural” não se articula mecanicamente com “tradição” mas vai ser a condição mesma para a transformação de um espaço sem história no símbolo da nação.

Bibiografia
Joseph, Isaac: La ville sanos qualités Paris, Éditions de l´Aube, 1998
Kolsdorf, Maria Elaine: A preservação dos espaços urbanos: marco teórico para o caso de Brasília. : Síntese dos trabalhos do GT Brasília p.8-18
Ribeiro, Sandra Bernardes: Brasília – Memória, Cidadania e Gestão do Patrimônio Cultural. São Paulo, Annalume, 20005
Leite, Rogério Proença: Contra-Usos da Cidade – Lugares e Espaço Público na Experiência Urbana Contemporânea. Campinas SP, Edit. UNICAMP; Aracaju SE, Edit. UFS, 2004
Jacques, Paola Berenstein: Espetacularização Urbana Contemporânea in Cadernos do PPG-FAU Territórios Urbanos e Políticas Culturas, Salvador, FAU-UFBA, 2004
Brasilmar Ferreira Nunes é professor do Depto de Sociologia da Universidade de Brasília, Pesquisador do CNPq.

Exposição Brasília Faz Bem Azulejos, Verdelejos...

Exposição Brasília Faz Bem Azulejos, Verdelejos...

Em homenagem aos 48 anos da cidade, o Terraço Shopping traz a Exposição Brasília Faz Bem Azulejos, Verdelejos... de 22 a 30 de abril. A mostra abriga estampas para ladrilhos criadas pelo Projeto Iconografia Aplicada DF, das artistas Carla Assis, Fátima Bueno e Ligia de Medeiros.

As três se juntaram para criar arte tendo a capital federal como tema e assinam a coleção inédita a ser exposta no Terraço. A exposição reúne vinte novos painéis em azulejos destinados a paredes e murais, em complemento à arquitetura. O grafismo dos azulejos explora a cartografia, os monumentos e o cerrado de Brasília.

Além da azulejaria, o trio atua com a proposta de abordar o repertório de ícones da cidade em diversos outros objetos artísticos e utilitários, como bandanas, canecas, cadernetas, estampas, tapetes, entre outros.

No final de 2004, Carla de Assis, Fátima Bueno e Ligia de Medeiros reuniram-se para planejar um trabalho de arte conjunto, tendo como tema a cidade de Brasília. Em maio de 2005, definiram fragmentos de monumentos, mapas e traçados urbanos, disposição de quadras, flora e fauna para aplicação em superfícies de diversos suportes como assuntos para pesquisa. Grafismos, malhas bidimensionais, recortes fotográficos surgiram para representar a cidade em objetos artísticos e utilitários, fortalecendo a identidade regional.

O projeto foi lançado com a exposição Brasília Faz Bem, na Referência Galeria de Arte em abril de 2007. Com a curadoria de Ralph Gehre, a galeria mostrou 26 painéis-repertório, parede de azulejos, instalações de objetos-ícones, bolsas, canecas, bandanas, cadernetas, digigravuras, jóias, painéis interativos, estampas adesivadas em vidro, recortes em superfícies rígidas.

Há produtos – arte, estampas e objetos – de autoria individual, identificadas, e parcerias entre as três idealizadoras do projeto.



Serviço
Exposição Brasília Faz Bem
Terraço Shopping – ala nova
De 22 a 30/04
Horário de 10h às 22h.
Informações: 3403-2992
Acesso livre e gratuito

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Resenha de "As causas sociais do declínio da cultura antiga", de Max Weber, por Carolina Vicente Ferreira Lima.

Resenha do texto:
Weber, Max. As causas sociais do declínio da cultura antiga. In Cohn, Gabriel (org.) Weber: Sociologia. Coleção Grandes Cientistas Sociais. São Paulo: Ática, 1997.


1. Idéia central tratada no texto:


A idéia central do texto é buscar as causas sociais do declínio da cultura antiga.
Para tanto, Max Weber procura encontrar nos aspectos internos, fundamentalmente nos aspectos sociais, as causas da queda do Império Romano.
Essas causas são encontradas em alguns aspectos sociais que se transformam ao longo do tempo e dão origem a novos tipos de relações sociais e a um novo tipo de organização político-econômica.
Pode-se destacar entre as causas do declínio o fim da tendência expansionista do Império, que levou a pacificação interna e externa e fez reduzir o aprovisionamento regular do mercado de escravos com material humano. A conseqüência dessa pacificação, segundo Weber, foi uma aguda crise de mão-de-obra e a posterior impossibilidade de que a produção progredisse com base nos quartéis de escravos. Assim, o escravo transforma-se em servo e é devolvido para a família e para a propriedade pessoal. A decadência da cultura antiga acontece, portanto, simultaneamente ao fortalecimento da família.
Além disso, a produção para a venda por meio do trabalho prestado nas condições da Antiguidade torna-se inviável, pois para a produção comercial era pressuposto imprescindível o quartel disciplinado de escravos. As grandes propriedades desligam-se assim do comércio e do mercado da cidade.
As cidades sem as trocas mercantis vão ao longo do tempo perdendo a sua importância.
Sendo assim, para Max Weber as causas da queda do Império podem ser encontradas em todos esses aspectos, principalmente no desaparecimento gradual do comércio e no conseguinte crescimento da economia natural e arrefecimento das atividades comerciais urbanas.


2. Principais conceitos utilizados:


Cidade: local portador da vida política, assim como da arte e da literatura. É também um local que se baseia originariamente na troca.
Oikos: organização de economia natural com centro na unidade doméstica patriarcal ou patrimonial.
Quartel de escravos: conjunto de escravos que pertencem a um proprietário e trabalham nas terras deste. Esses escravos não possuem família, nem propriedade. O trabalho realizado por eles é rigorosamente disciplinado e é inspecionado por capatazes.
Servo: trabalhador rural que cultiva a terra conferida pelo senhor e que em compensação está obrigado a determinadas prestações.


3.Breve síntese do texto:


As causas do declínio do Império Romano não são externas ao Império. Quando este se fragmentou, não foi subitamente, no embate com alguma força poderosa. As causas de seu declínio podem ser buscadas em fatores internos.
Max Weber lembra, entretanto, que a desagregação do Império não coincide com a derrocada da cultura da Roma Antiga. Segundo ele o Império Romano, considerado como entidade política, sobreviveu vários séculos ao apogeu de sua cultura. Já em princípios do século III a literatura romana, a poesia latina e grega e a historiografia já haviam se esgotado.
Assim sendo, a principal questão que o autor busca responder ao longo do texto é esta: a que se deve a queda da cultura no Mundo Antigo?
Ele argumenta que foram usadas as mais variadas explicações para dar resposta a essa pergunta. Alguns estudiosos dizem que a desagregação do Império se deve ao despotismo que teria, em certa medida, esmagado psiquicamente o homem antigo, sua vida pública, sua cultura. Outros dizem que as causas são o luxo e a imoralidade dos círculos sociais mais elevados. Ou ainda, a causa seria a mulher romana emancipada e o rompimento do vínculo matrimonial entre as classes dominantes que teriam desfeito as bases da sociedade. Utilizou-se até mesmo uma hipótese darwinista que afirma que o processo de seleção, praticado no recrutamento do exército, e que condenou ao celibato os mais fortes, acabou por degenerar a raça antiga.
Porém, para sua explicação, Weber não considera nenhuma dessas hipóteses. Ele utiliza fundamentalmente causas sociais.
Para explicar a queda do Império Romano Max Weber considera importante analisar as peculiaridades da estrutura social da Antiguidade, pois segundo ele o ciclo de desenvolvimento da cultura antiga está determinado por elas.
Sendo assim, é importante ressaltar primeiramente o caráter urbano da cultura antiga. Nessa cultura a cidade é portadora da vida política, assim como da arte e da literatura. Também é a cidade o centro econômico, onde ocorrem as trocas dos produtos da indústria urbana com os frutos da estreita orla agrícola circundante.
A cultura antiga da Europa é também uma cultura litorânea, assim como sua história é, de início, a história das cidades costeiras, algumas sendo os grandes centros comerciais da época.
Quanto ao comércio, este não era muito intenso e reduzia-se a uma fina camada de artigos de luxo. As trocas ocorridas nas cidades são diretas e imediatas entre produtores e consumidores, cobrindo assim, as necessidades sem importação do exterior.
A cultura antiga é também uma cultura escravista. Os escravos eram obtidos por meio de guerras, que levavam constantemente material humano para o mercado, e que desta maneira fomentavam o trabalho servil e a acumulação de homens.
Ao longo do tempo algumas dessas características da cultura antiga vão mudando. Uma das mudanças é que com a inclusão de grandes áreas de terras interioranas, fortalece-se de modo decisivo a significação cultural do trabalho servil. O centro de gravidade da população do Império Romano translada-se para o interior. Com isso, a cultura antiga muda seu cenário, convertendo-se de cultura litorânea numa cultura interiorana. O proprietário de escravos passa a ser, assim, o suporte econômico da cultura antiga, e a organização do trabalho de escravos passa a constituir a infra-estrutura imprescindível da sociedade romana.
Segundo Weber o ponto crítico da evolução da cultura antiga se dá com uma aguda crise de mão-de-obra. Com o fim da tendência expansionista do Império Romano e, com a pacificação interna e externa, contrai-se e reduz-se o aprovisionamento regular do mercado de escravo como material humano e, assim, instala-se uma crise de mão-de-obra. Com isso torna-se impossível continuar a produção com base nos quartéis de escravos.
Em conseqüência o escravo transforma-se em servo e passa a possuir uma família, assegurando, assim, a renovação e, portanto, uma provisão permanente de força de trabalho, que já não podia ser procurada no mercado de escravos.
Essa evolução trata-se de um forte processo de transformação nas camadas inferiores da sociedade: a família e, paralelamente a esta, a propriedade pessoal são restituídas às camadas inferiores.
Assim, as trocas comerciais vão paulatinamente diminuindo, pois para a produção comercial era pressuposto imprescindível o quartel disciplinado de escravos. Nas regiões internas principalmente, em que os servos viviam esparramados em casarios, a produção para a venda teve que acabar e os sutis fios de comércio, estendidos sobre aquele fundo de economia natural, tiveram que se enfraquecer mais, e por fim, romper-se.
É desta maneira, portanto, que Max Weber explica a queda da cultura antiga. Para ele a queda do Império Romano foi a forçosa conseqüência política do desaparecimento gradual do comércio e do conseqüente crescimento da economia natural. E, na essência, significou tão-somente a eliminação do antigo aparelho administrativo e, portanto, da superestrutura política de um regime de economia monetária, que já não se ajustava à infra-estrutura econômica, que vivia num regime de economia natural.


4. Comentários, dúvidas e/ou críticas:


Max Weber se propõe a encontrar as causas sociais do declínio da cultura antiga e de fato muitas das explicações dadas por ele são sociais, tais como o fortalecimento da família e o surgimento de novas relações sociais e de trabalho, que é o caso, por exemplo, da relação entre servos e o proprietário da terra. Entretanto, boa parte de sua explicação está calcada em aspectos econômicos, tais como o desaparecimento gradual do comércio e o crescimento da economia natural. Assim, pode-se dizer que sua explicação é essencialmente social, mas que também leva em consideração muitos aspectos econômicos.
Algo que também é importante ser destacado é o desaparecimento da cidade e o quanto esta era muito importante para o que Max Weber chama de cultura antiga. Segundo ele era a cidade a portadora da Arte, da Literatura, da Ciência. Com o desaparecimento dela desaparece também a cultura. Além disso, vale destacar que o que leva a derrocada da cidade é o desaparecimento do comércio, provando assim que a cidade é o local da troca e do comércio, quando este diminui sua intensidade a cidade desaparece também.

segunda-feira, 10 de março de 2008

"Um bom sanduíche na Califórnia", por Breitner Tavares.


A Califórnia é um dos espaços mais contrastantes que já havia experenciado em minha vida. San Francisco e a região circunvizinha, chamada Bay Area, trazem várias peculiaridades em termos da vida social. A cada esquina se dispõe um manifesto, um gesto, falas em volta de idéias como juventude, liberdade, paz e amor, justiça e esperança. Tudo isso perpassa uma cidade que se oferece enquanto um postal, um produto a ser consumido. Em suas encruzilhadas, com gente de todo o mundo, ela emana vitalidade. Turistas, músicos, policiais, sem teto, disputam lugar na City. Será que os ares da cidade realmente libertam? O multiculturalismo, termos de raça/etnia e gênero, não privam a cidade de suas contradições; ao contrário, lhe ateiam fogo. O resultado é uma cidade intensa que pode mudar rapidamente. No verão às vezes temos nevoeiros com baixas temperaturas e no inverno podemos encontrar dias ensolarados. Esses são o clima e a alma da multidão solitária que se mira a si mesma em Bay Area. Toda gente quer estar sob as luzes da cidade.
Após oito meses, desde que vim para a Berkeley para participar do programa de doutorado sanduíche no programa Fulbrigh-Ford tenho tido uma experiência singular em termos de minha vida acadêmica e pessoal. Tive aulas de inglês no período pré- acadêmico em San Francisco, onde convivi com outros estudantes internacionais, basicamente chineses e coreanos interessados em business and management.
Na Universidade Berkeley eu participei de um curso de verão, no qual pude conviver com outros/as estudantes internacionais, vindos/as de diversas partes do mundo, especialmente da Ásia. As atividades eram intensas e demandavam um grande esforço para um bom aproveitamento.
Nesse curso de verão em Berkeley, os/as estudantes eram em geral jovens que tinham recentemente ingressado em seus cursos de graduação, especialmente em business and management ou marketing. Eles/as estavam interessados em conhecer um pouco do “sonho Americano”. Digo isso, simplesmente para tentar definir um pouco o contraste estabelecido. As vezes, me perguntava se eles admiravam mais o fato de eu não ser mais um jogador de futebol, ou de ser um estudante de doutorado de sociologia, negro, numa universidade como Berkeley. Mas creio que foi uma boa oportunidade para eles/as e para mim para desfazer certos equívocos das identidades nacionais.
A Universidade de Berkeley se encontra entre as melhores universidades dos EUA. A estrutura acadêmica, em termos de ensino e pesquisa, é surpreendente, os recursos como bibliotecas e base de dados são impressionantes. Além disso, Berkeley é conhecida como um espaço para o pensamento crítico da própria sociedade americana. O departamento de Estudos Étnicos, é um exemplo disso. No final dos anos 60, durante a efervescência dos movimentos pelos direitos humanos nos EUA, estudantes e pesquisadores/as negros/as e latinos/as assumiram sua posição junto aos movimentos sociais da época. Exigiram a criação de um novo departamento de acadêmico que fosse capaz de produzir um conhecimento que compreendesse os eventos de seu tempo, para além de abordagens fragmentárias das tradicionais disciplinas das ciências humanas. A adesão desses/as intelectuais e ativistas a um movimento de greve de trabalhadores/as afro-latinos/as, em 1968, gerou uma série de protestos, que acarretaram em prisões e outras agressões contra estudantes e professores/as. Essa tensão social gerou um debate no contexto político universitário que culminou com a criação do departamento de Estudos Étnicos em 1969, que teria, como característica, a multidisciplinaridade e a crítica aos valores coloniais ainda presentes no pensamento moderno.
Minha experiência em Berkeley tem sido muito proveitosa: tenho freqüentado alguns cursos e seminários de pesquisa, além de tentar conciliá-los com a redação da minha tese de doutoramento. Tenho buscado manter contato com outros/as intelectuais, que, ao assumirem suas posições enquanto mulheres, negras, latino-americanas, indígenas e homossexuais entre outras, vão além da tradicional “decadência disciplinar”. Isso significa, entre outros, redefinir o sentido da objetividade do conhecimento, bem como de suas implicações no mundo da vida. Resolvi compartilhar um pouco da minha experiência escrevendo alguns textos para um blog "Laboratório Brasília" criado e mantido por pesquisadores na área de Sociologia Urbana na UnB.
Termino como alguns jovens costumam dizer na Ceilândia-DF: “O bagulho é loko, agora é nós na fita véi!”

Breitner Luiz Tavares
(bolsista, 2006, breitnert@hotmail.com)